Educação transformadora de realidades

A Professora Débora Garofalo dá continuidade à série de entrevistas com os embaixadores do Prêmio Professor Transformador e destaca a importância da Educação como meio de transformar a realidade na qual a escola está inserida 

Educação como instrumento de transformação da realidade e tendo estudantes e professores, juntos, como protagonistas desse processo. Esses são valores que se destacam nas palavras da Profa. Débora Garofalo, terceira entrevistada na série de conversas que o Instituto Significare está promovendo com os embaixadores do Prêmio Professor Transformador. 

A educadora fala a partir da própria experiência: em 2014, a Profa. Débora iniciou na escola em que lecionava na cidade de São Paulo o Projeto “Robótica com Sucata”, no qual mobilizou os alunos para aprenderem a construir utensílios com os conhecimentos da robótica a partir da coleta de materiais descartados nas ruas da comunidade na qual a escola estava inserida.

Acompanhe a entrevista:

Certamente, muitos dos desafios que superou ao longo da sua trajetória são desafios comuns a muitos educadores e educadoras. Quais foram os maiores e como os superou?

Profa. Débora Garofalo: Todo professor enfrenta muitos desafios na carreira. Seja por conta da formação, que em muitos casos ainda precisa ser aprimorada, ou seja pela ausência de uma formação continuada, principalmente nesses novos tempos, que trazem muito forte a questão da tecnologia, de metodologias ativas, de novas abordagens dentro da sala de aula (como as abordagens stem/steam, que são abordagens investigativas, que trabalham em diversas áreas do conhecimento). Mas eu acho que a maior dificuldade, realmente, é enfrentar os problemas sociais existentes e que afetam muito a Educação. Foi um pouco do que eu tive que enfrentar para levar o trabalho de robótica com sucata para os estudantes, que nasceu de um problema. Um problema real, que foi a questão do lixo. Um lixo que impedia essas crianças de irem para a escola em dias de chuva e que trazia doenças como dengue e leptospirose. Diante de tudo isso, o desafio foi realmente mostrar que eles poderiam ser protagonistas na superação dessa dificuldade e, principalmente, trazer algo que fosse realmente significativo. Que eles pudessem estar associados a esses novos tempos e trazer ali todo um protagonismo juvenil para que esses estudantes pudessem, então, atuar como multiplicadores de informação para toda a comunidade e transformar, de fato, a sua comunidade através do Conhecimento e da Educação. Eu acho que esse, sem dúvida, foi um dos maiores desafios. Outro, claro, foi lidar com os próprios colegas que não acreditavam ou que, quando acreditavam, viam que o projeto gerava um trabalho muito grande de ter que ir às ruas, coletar materiais…então, foi preciso mudar também a concepção docente para mostrar a esse professor que ele poderia envolver o território educativo. E por fim, a própria dinâmica de envolver. A gente ainda tem muita dificuldade na Educação de envolver o território educativo em ações pertencentes. E isso só foi possível quando os próprios moradores ali daquela comunidade começaram a sentir essa melhora, com a redução das enchentes e do lixo nas ruas. Foi aí que eles realmente começaram a compreender o trabalho educacional que estava sendo feito. Esses foram alguns dos desafios que enfrentei,  mas eu acho que o maior desafio que nós estamos enfrentando hoje na Educação, sem dúvida nenhuma, é o de realmente compreender que ela pode ser inovadora, que ela pode ser transformadora e que o estudante é o centro do processo, é o protagonista. É para isso que a gente precisa quebrar com velhos paradigmas e trazer inovação para dentro da sala de aula.

Os desafios impostos à Educação pela pandemia não foram poucos. Muito foi feito com o apoio da tecnologia, mas o papel do professor, como você avalia e define o papel o do professor transformador neste novo contexto da Educação?

Profa. Débora Garofalo: Vou começar respondendo que é preciso ter altas expectativas em relação aos nossos estudantes, mas que também é essencial ter altas expectativas para os nossos professores, sobretudo diante de um cenário que não foi pensado, não foi planejado por ninguém e que talvez, há algum tempo, se nos perguntassem se seria possível, por exemplo, conduzir aulas mediadas por tecnologia, diríamos que seria impossível ou muito difícil. Mas os professores, mesmo diante de tantas dificuldades, principalmente daqueles que realmente tinham dificuldades com a tecnologia, se reinventaram para que a Educação não parasse ali no chão da escola. E isso foi muito bonito de se ver e ouvir os relatos dos colegas quanto a essa superação, para poderem estar ali, mediando esse processo de conhecimento e fazendo uma busca ativa com os estudantes, para tentar minimizar os impactos da pandemia na Educação. De lá para cá aprendemos muito. Aprendemos a importância e papel da tecnologia, não como fim, mas como meio, como uma mola propulsora ao processo de aprendizado e que, com ela, precisam vir metodologias e abordagens diferenciadas, como as metodologias ativas que visam tirar esse estudante da passividade e trazê-lo ao centro do processo de aprendizagem. Estamos evoluindo para novos tempos, nos quais é possível mostrar que você pode inovar com tecnologias existentes e que as tecnologias analógicas também funcionam. O importante é priorizar a humanização dessas tecnologias, principalmente quando a gente fala de Educação 5.0, que visa trabalhar as habilidades socioemocionais e integrar a tecnologia de uma forma mais humanizadora. Então, que esses novos tempos também venham arraigados com a educação integral.

Transformação talvez seja uma das palavras mais pertinentes no atual contexto do nosso país. Na sua visão, quais as transformações possíveis e desejáveis que os professores podem ajudar a promover, com base nas suas práticas?

Profa. Débora Garofalo: Como eu disse, é necessário ter altas expectativas para os nossos estudantes e professores. Os nossos professores são os que, de fato, têm transformado a Educação, os que fazem a Educação na ponta. É através das suas práticas (e eu falo isso até por experiência própria, pois tive um trabalho reconhecido nacional e internacionalmente e que hoje é uma política pública) que ele pode dar, pode direcionar caminhos para a nossa Educação. Então, sem dúvida nenhuma, os professores precisam estar inseridos dentro dos debates públicos, dentro das políticas públicas, mas também olhar para o que os professores têm feito em sala de aula nos ajuda a direcionar e transformar essas boas práticas que eles já fazem em caminhos para uma verdadeira transformação na nossa Educação.

Quem é o Professor Transformador, que possibilita conectar a educação a um presente e futuro desejáveis? 

Profa. Débora Garofalo: Um professor transformador é aquele que tem a capacidade de mediar o conhecimento, de fazer essa mediação do estudante com o conhecimento, mas buscando diversas formas de inovar. É aquele que possibilita caminhos para que o estudante assuma esse protagonismo. E sem dúvida nenhuma, o professor transformador é aquele que guia a Educação e a faz acontecer na ponta. Ele é uma peça fundamental que precisa, sim, ser valorizada, reconhecida, mas que acima de tudo tem um papel essencial em toda essa engrenagem que é a Educação, de transformar vidas.

E a escola, como pode ser essa escola que possibilita conectar a Educação a um presente e futuro desejáveis?

Profa. Débora Garofalo: A Educação e a escola, principalmente, mudaram os seus papéis. Por muito tempo, a escola teve um papel muito passivo, de trabalhar somente ali, com aqueles estudantes, e o professor ser o transmissor do conhecimento. Hoje, essa escola exerce um papel fundamental, principalmente como vimos na pandemia, que ela não é só um local de aprendizagem. Ela é o local de uma real rede de proteção para a infância e a juventude. Ela é o espaço onde o estudante exerce o seu papel de se integrar com o mundo, de conhecer possibilidades. Então, ela também vem se reinventando ao longo dos tempos. Passou daquela escola tradicional que nós víamos, com cadeiras e carteiras enfileiradas, para esse novo conceito que trabalha muito a questão da colaboração, da empatia, da resolução de problemas. Então, essa escola hoje é ativa, mas ainda precisa romper com alguns paradigmas, principalmente entender que escola não é ilha. Ela precisa se abrir, trazer novas vozes para estarem ali, dialogando dentro do seu dia a dia, como trazer os órgãos públicos, por exemplo, para conversar e dialogar dentro da unidade escolar.

Que mensagem você deixa para os professores e professoras que superam desafios diários para empreender uma Educação Transformadora?

Profa. Débora Garofalo: A mensagem que eu deixo para os meus colegas é que eles possam ser resilientes, persistentes. A mudança para uma Educação Transformadora não ocorre da noite para o dia, mas é uma mudança cultural. E como toda mudança cultural, ela passa por fases. Por isso, é preciso persistir, ter essa resiliência para poder realmente apoiar o nosso estudante nessa transformação. Que o nosso estudante possa não ser apenas consumidor de tecnologia, mas sim produtor. E para que ele possa exercer esse papel, ele precisa ser protagonista. É aí que o professor tem esse papel essencial, que é o de mediar e guiar esse conhecimento.

Para finalizar, gostaríamos que fizesse um convite aos educadores de todo o Brasil para que participem do Prêmio Professor Transformador segunda edição:

Profa. Débora Garofalo: Um prêmio é sempre a celebração de um longo processo, de um longo caminho do professor e, sem dúvida nenhuma, também a valorização do seu trabalho. Então, deixo aqui o convite aos professores para que eles possam se inscrever no Prêmio Professor Transformador 2021, para que possamos aprender um pouco com as suas práticas e nos inspirarmos através delas. Porque o professor é um grande transformador da sociedade. Então, através desse reconhecimento, através do reconhecimento de um prêmio, podemos aprender com esse professor e também multiplicar as suas práticas em todas as salas de aula do nosso país.

 

Conhecendo melhor a Profa. Débora Garofalo

Formada em Letras e Pedagogia e com especialização em Língua Portuguesa pela Unicamp, Débora Garofalo é também Mestre em Linguística pela PUC-SP e FabLearn Fellow, Columbia, EUA. Leciona há 16 anos na rede pública de São Paulo. Atualmente é Coordenadora do Centro de Inovação da Educação Básica da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo (SEDUC – SP), implementando uma tríade de Inovação, através de iniciativas como o Programa Inova Educação, Movimento Inova e o Centro de Inovação, com democratização do acesso à tecnologia e inovação. Foi colunista de grandes veículos de comunicação e, atualmente, é Colunista na Editora Moderna, pela qual está para lançar um novo livro. É também colunista da Revista Educação, integrante da Comissão de Direitos Humanos da Cidade de São Paulo e Embaixadora Professora do Instituto Ayrton Senna. É palestrante em grandes eventos nacionais e internacionais e vencedora de diferentes prêmios na área da Educação, entre eles Professores do Brasil 2018 e Desafio de Aprendizagem Criativa do MIT 2019. É considerada ainda uma das 10 melhores Professoras do Mundo pelo Global Teacher Prize 2019, considerado o Nobel da Educação. A Profa. Débora é embaixadora do Prêmio Professor Transformador e inspira toda a sua rede de professores transformadores.

Link de Inscrição para a 2ª edição de Prêmio Professor Transformador: https://significare.org.br/premio/